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    Juíza de São Caetano do Sul contraria parecer do MP e nega conversão de união estável homossexual em casamento

    Juíza de São Caetano do Sul contraria parecer do MP e nega conversão de união estável homossexual em casamento

    Poder Judiciário do Estado de São Paulo

    Comarca de São Caetano do Sul/SP

    HABILITAÇÃO PARA CASAMENTO

    Processos nº 485/2011

    Pretendentes: Sandro Luís do Nascimento

    Milton César Pereira de Sá

    Vistos:

    Sandro Luís do Nascimento e Milton César Pereira de Sá, ambos do sexo masculino , formularam pedido de conversão de união estável em casamento junto ao Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais e de Interdições e Tutelas da Comarca de São Caetano do Sul.

    Instruíram o pedido com documento particular de fls. 04/05, devidamente registrado, no qual declaram que convivem em união estável desde janeiro de 2005.

    O edital exigido por lei fora regulamente publicado e cumpridas as demais formalidades não houve qualquer impugnação.

    O Ministério Público manifestou-se favoravelmente à pretensão dos interessados.

    É o relatório do necessário.

    Fundamento e decido.

    O procedimento instaurado versa sobre dúvida na possibilidade de conversão de união estável em casamento entre pessoas do mesmo sexo.

    Em recente julgamento, o Supremo Tribunal Federal aplicou os princípios da igualdade, da liberdade e da dignidade da pessoa humana e declarou que a leitura do artigo 1.723 do Código Civil, de acordo com a Constituição Federal, abarca as uniões homoafetivas ao lado das heteroafetiva.

    Contudo, em nenhum momento o Supremo Tribunal Federal decidiu pela possibilidade de conversão da união estável em casamento ou de casamento entre pessoas do mesmo sexo.

    Observo que do ponto de vista jurídico, a união estável não se confunde com o casamento, os quais possuem requisitos e consequências distintas, não havendo que se falar em equiparação dos institutos, tampouco extensão ao casamento da decisão da Suprema Corte sobre união estável.

    A decisão do Supremo Tribunal Federal reconheceu que as uniões homoafetivas devem ser consideradas como entidades familiares, com proteção do Estado em todos os seus aspectos, porém, sem possibilidade de conversão em casamento, já que este possui aspectos próprios.

    Anote-se, ainda, que tanto a união estável (hetero ou homoafetiva), com o casamento constituem modalidades de entidade familiar, não hierarquizadas, mas diferentes.

    A própria Constituição Federal optou por manter o casamento como ato solene, privilegiando, ao menos nesse aspecto, a noção de instituição, tanto que o regulamenta pormenorizadamente, exigindo, também, a chancela estatal para sua concretização.

    Nesse sentido são as regras que dispõe sobre a realização, celebração, capacidade para o casamento, impedimentos e causas suspensivas. É da essência do matrimônio essa formalização, sem que se esteja a desmerecer ou inferiorizar as demais modalidades de família.

    O que não se pode é, por decisão judicial, instituir ou alargar previsão legal que, até o momento, não existe: a propósito, a opção aqui é legislativa e caberá ao Poder Legislativo dispor sobre a possibilidade de casamento entre pessoas do mesmo sexo.

    Logo, à mingua de previsão legal ou diretriz normativa disciplinando o tema, tenho que a pretensão formulada é inviável: não se trata de estabelecer desigualdade entre uniões de pessoas do mesmo sexo e de sexos diversos, mas sim de, sob a ótica registrária, definir a impossibilidade do casamento civil entre pessoas do mesmo sexo e a conversão da união estável em casamento.

    Por tais motivos, deixo de homologar o pedido de conversão de união estável em casamento formulado por SANDRO LUÍS DO NASCIMENTO e MILTON CÉSAR PEREIRA DE SÁ . P.R.I.C.

    São Caetano do Sul, 26 de julho de 2011.

    Daniela Anholeto Valbão

    Juíza de Direito

    Leia a íntegra do Parecer da Promotoria de São Caetano do Sul

    Ministério Público do Estado de São Paulo

    Habilitação de casamento 485/11

    M.M. Juíza:

    Trata-se de pedido de conversão de união estável em casamento formulado por Sandro Luís do Nascimento e Milton César Pereira de Sá.

    No dia 7 de julho do mês corrente, foi expedida cópia do edital de proclamas para publicação na imprensa local (fls. 9).

    Opino.

    Os requerentes juntaram aos autos cópia do contrato de união homoafetiva celebrado em 29 de março de 2010 (fls. 4/5). Portanto, os postulantes já vivem em união estável há mais de um ano.

    Às fls. 9, há a declaração da mãe de Milton, confirmando que seu filho vive em união estável com Sandro desde janeiro de 2005. Jeferson Bunder (fls.10) também confirma que os requerentes vivem “com comunhão de vidas e de interesse patrimonial, sendo que o referido relacionamento não sofreu qualquer interrupção até a presente data”.

    Portanto, plenamente caracterizada a união estável homoafetiva.

    Agora, pretendem os requerentes convertê-las em casamento.

    O pedido dos requerentes encontra fundamento no artigo 1723 e 1726 do Código Civil, além do disposto no art. 226, § 3º, in fine, da Constituição Federal.

    O primeiro e no último artigos citados dispõem sobre o que se entende por união estável. E da leitura dos dispositivos, verifica-se ser reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua, duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família.

    A união estável somente não se constituirá se ocorrerem os impedimentos do art. 1521 do Código Civil. Cabe aqui ressaltar o fato de que a igualdade de sexos não é arrolada pelo referido dispositivo legal como impedimento matrimonial. Maria Helena Diniz (Código Civil Anotado, ed. Saraiva, págs. 1016/1017) preleciona que os impedimentos dirimentes públicos ou absolutos resultam de parentesco (CC, art. 1521, I a V), por consanguinidade, afinidade ou adoção, ou de vínculo (CC, art. 1521, VI), ou ainda de crime (CC, art. 1521, VII). A lei em nenhum momento estabelece a diversidade de sexos como requisito para o matrimônio válido.

    Bem, recente decisão prolatada pelo Supremo Tribunal Federal nos autos da ADIN 4277 e ADPF 132, reconheceu a união homoafetiva como entidade familiar.

    Esclarecendo o teor da decisão a todos os Presidentes de Tribunais de Justiça do Brasil, o Ministro César Peluso (documento 1) informa que “comunico a Vossa Excelência que o Supremo Tribunal Federal, na sessão plenária realizada em 5 de maio de 2011, por unanimidade, conheceu da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 132 como ação direta de inconstitucionalidade. Também, por votação unânime julgou procedente a ação, com eficácia erga omnes e efeito vinculante, para dar ao art. 1723 do Código Civil interpretação conforme a Constituição para dele excluir qualquer significado que impeça o reconhecimento da união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como “entidade familiar”, entendida esta como sinônimo perfeito de “família”. RECONHECIMENTO QUE É DE SER FEITO SEGUNDO AS MESMAS REGRAS E COM AS MESMAS CONSEQUÊNCIAS DA UNIÃO ESTÁVEL HETEROAFETIVA (NEGRITO NOSSO)” .

    Ora, uma das consequências do reconhecimento da união estável heteroafetiva é aquela prevista no art. 1726 do Código Civil e art. 226, § 3º, in fine da Constituição Federal: a união estável poderá converter-se em casamento, mediante pedido dos companheiros ao juiz e assento no Registro Civil.

    Vê-se, portanto, que não há como negar aos postulantes o direito de converter em casamento a união estável que mantêm. Constituem os dois entidade familiar e, portanto, podem converter essa união em casamento, pois o reconhecimento da união estável homoafetiva terá as mesmas consequências da união heteroafetiva.

    Sobre o assunto, cabe trazer à colação a Carta Aberta lançada pela Arpen Brasil �- Associação dos Registradores Civis das Pessoas Naturais no dia 25 de maio deste ano (documento nº 2). Por ela, a Arpen “torna público sua posição... de apoiar, em sua totalidade, a decisão exarada pelo Supremo Tribunal Federal de reconhecer a entidade familiar configurada pelas uniões homoafetivas. Mais que isso, a Arpen defende, uma vez consagrada a união estável homoafetiva, que, em nome da segurança jurídica e da garantia dos direitos dos interessados, essas relações tenham seu vínculo reconhecido definitivamente, transformando-o de precário em vínculo civil, mediante sua conversão em casamento, nos exatos termos do art. 226, § 3º da Constituição da República”.

    Importante mencionar as lições de Maria Berenice Dias, em seu artigo “A democratização do casamento” (documento nº 5). Segundo ela, “depois do pronunciamento da Corte Suprema, o grande questionamento que surgiu foi sobre a possibilidade ou não de os homossexuais casarem. Para os conservadores da plantão, teriam sido assegurados aos homossexuais os direitos da união estável, o que não lhes garante acesso ao casamento”.

    Prossegue a grande jurista: “Mas juízes sem medo de preconceito fizeram um silogismo singelo: se a Constituição Federal determina que seja facilitada a conversão da união estável em casamento, e o Supremo Tribunal determinou que não fosse feita qualquer distinção entre uniões hétero e homoafetivas, não tiveram dúvida em cumprir a recomendação constitucional, obedecer a decisão da Corte Suprema e assegurar o direito à felicidade a quem há muito havia constituído uma família e desejava casar”.

    A possibilidade jurídica da conversão da união estável homoafetiva em casamento já foi reconhecida judicialmente em pelo menos duas oportunidades, por sentenças transitadas em julgado em Jacareí (SP) e Distrito Federal, conforme cópias anexas (documentos 3 e 4).

    Portanto, após o prazo dos proclamas e não havendo impugnações, opino pela CONVERSÃO EM CASAMENTO da união estável dos requerentes, no regime da comunhão parcial de bens (fls. 2), permanecendo eles com os mesmos nomes de solteiro.

    São Caetano do Sul, 12 de julho de 2011.

    Luis Marcelo Bassi

    Promotor de Justiça

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