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19 de Abril de 2024
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    Artigo - O fim da separação no ordenamento jurídico brasileiro - Por Newton Teixeira Carvalho

    Neste primeiro dia da publicação da emenda constitucional 66/2010 e conseqüente alteração do art. 226, § 6º, da Constituição Federal e após permutar algumas idéias, por intermédio de telefonemas, com alguns colegas e amigos, militantes no Direito das Famílias, bem como após algumas reflexões, sinto-me na obrigação de lançar alguns pontos de vistas, para debates.

    Não ficaremos atrelados, para tanto, em nenhum março teórico. Opinaremos como juiz familiarista, há mais de 12 (doze) anos, e cônscio de que o Estado deve, sempre que possível, intrometer menos nas vidas particulares das pessoas. Assim, desprezaremos, nestas colocações, surrados e ultrapassados mitos, como, por exemplo, de que o Estado deve salvar o casamento, a todo custo; que o casamento é a melhor forma de constituição de entidade familiar; que o divórcio acabará com a família brasileira etc.

    Entendemos que, independentemente de rótulo, de prevalecer, em um relacionamento a dois, o afeto. Não existindo amor, já não há mais casamento. Comungando com tal opinião, pela primeira vez ouvimos, em uma cerimônia de casamento que tivemos a honra de assistir no último sábado, em Belo Horizonte, do sacerdote católico, ao falar aos nubentes e, por conseqüência, a todos nós os presentes que, se morto o amor, não há mais casamento. Portanto, prevaleceu, também àquele religioso, o entendimento de que a convivência em comum, até que a morte os separe, não é a morte física. E, o mesmo sacerdote acabou também afirmando que todos têm o direito a tentar um novo amor, de ser feliz.

    Assim, de desprezar o entendimento, inclusive a mim formulado por um repórter, no sentido de que, em razão da emenda constitucional em comento, estaríamos facilitando o descasamento. A resposta, nossa, foi a de que quis, realmente, o legislador, ao aprovar a PEC 28/2009, facilitar o divórcio, certamente sabendo que, se não mais existir afeto, casamento não há. O desamor antecede ao divórcio. Existindo afeto, nenhum dos cônjuges pensará em se divorciar. Não existindo, o divórcio será o caminho único e natural. Quanto mais rápido percorrido este caminho, menos traumatizante será.

    Pretendeu, sim, o legislador facilitar o divórcio, ciente também de que, desde o advento da Constituição Federal de 1988, não há mais razão para manter um casamento, sem amor, com o casal dormindo em cama separada e se digladiando diurnamente, não obstante, perante a Sociedade, apresentando sorridentes e, ainda, apesar da separação de fato, de vários anos, celebrando bodas, de prata, ouro, diamante e tantas outras, permitidas pela idade e pela hipocrisia.

    Portanto, a partir da modificação ocorrida no artigo 226, § 6º, da Constituição Federal, com vigência a partir de hoje (14/07), a determinar que "o casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio", de entender-se sepultada a esdrúxula dicotomia, de nenhuma compreensão perante os jurisdicionados, da existência de dissolução da sociedade conjugal, através da separação, e dissolução do vínculo matrimonial, através do divórcio.

    Não há mais separação no direito brasileiro. Agora, de imediato, há que se decretar o divórcio do casal. Pela evolução histórica a separação deixa de ser um estágio necessário ao divórcio.

    Insistir, numa leitura apressada e apenas literal do atual art. 226, § 6º, da Constituição Federal, na manutenção do instituto jurídico da separação no direito brasileiro, é revogar a própria Constituição que elegeu, como princípio maior das entidades familiares, o afeto.

    Advogar a tese da permanência da separação no direito brasileiro é também querer fomentar discussão acerca de quem é o culpado pela desunião. É exigir que a vida íntima do casal seja escancarada perante os Tribunais.

    Portanto, discordamos da opinião daqueles que insistem na manutenção da separação no Direito brasileiro, sob argumento, principal, de possível dúvida do casal, em se divorciarem. Na verdade, tal entendimento ratifica apenas a imaturidade do casal e despreza o atendimento prévio do casal, no escritório do advogado, com várias reuniões e até meses de negociações.

    E, mesmo após orientação do advogado, se ainda não há certeza do casal, quanto ao divórcio, basta o ajuizamento de cautelar de separação de corpos, em nossa opinião de caráter satisfativa. E, se houver reconciliação posterior, é caso de requerer a extinção da cautelar.

    Para os que não admitem caráter satisfativo, na cautelar de separação de corpos, poderá haver o ajuizamento da ação ou do requerimento de divórcio e, após ou até mesmo na petição inicial, pugnar pela suspensão do feito, por até um ano, tempo suficiente para superação de possível dúvida.

    Outros insistem na tese da manutenção do instituto da separação, concomitantemente com o do divórcio, sob o argumento de que não houve revogação expressa dos artigos do Código Civil, que tratam da separação. Porém, sabemos que não andou bem o legislador ao pretender impor, tempos atrás, no Direito brasileiro, a revogação apenas legal (expressa). Como sabido, os demais meios de interpretação subsistem e, através deles (finalísticos, teleológicos, histórico etc), conclui, facilmente, que todos os artigos do Código Civil, que tratam exclusivamente da separação, foram revogados.

    Não há nenhuma lógica na coexistência da separação e do divórcio. A pretensão do legislador foi o de excluir a separação do ordenamento jurídico brasileiro, como aconteceu em vários outros países.

    Portanto, se não mais existe separação no Brasil, como ficam as ações ou requerimentos de separação em andamento ou já julgados? Sugerimos o seguinte:

    a) com relação às separações em andamento, o juiz ou o Tribunal deverá facultar as partes, no prazo de 10 (dez) dias, requerer, nos próprios autos, a conversão da separação em divórcio, inclusive se já prolatada sentença, porém sem o trânsito em julgado. Caso não modificado o pedido, de separação para divórcio, aos autos deverão ser extintos, por impossibilidade jurídica do pedido. Não há que se falar em direito adquirido contra a Constituição Federal, mesmo em se tratando de emenda Constitucional. Evidentemente que, se existirem pedidos cumulados, a ação prosseguirá, normalmente, com relação aos pedidos remanescentes e independentes, como por exemplo, alimentos, guarda etc;

    b) no que tange às separações já decretadas, com sentença trânsita em julgado, a qualquer momento o divórcio poderá ser pleiteado, em apenso. Enquanto não pleiteado o divórcio, o estado destas pessoas continua como de separado;

    c) caso, a partir de hoje, haja pedido de separação, os autos deverão, de plano, ser extintos, por impossibilidade jurídico do pedido, eis que não mais há separação no direito brasileiro.

    Outra modificação provocada pela atual redação do artigo 226, § 6º, da Constituição Federal, foi a desnecessidade, no divórcio administrativo (cartorário), da exigência de declaração de testemunhas, com firmas reconhecidas, para comprovação do lapso temporal.

    Portanto e em razão da emenda constitucional em análise, fincamos, de vez, "o coração" no Século XXI. Entretanto e para que não haja retrocesso e tudo continue como dantes, mister é que nos despimos de preconceitos. Urge superarmos paradigmas; que façamos, sempre, a distinção entre moral, direito e religião, tripé ainda necessário, em razão do grau de inteligência da sociedade atual.

    Autor: Newton Teixeira Carvalho é Juiz de Direito da 1ª Vara de Família em Belo Horizonte, Professor de Processo e Direito de Família da Faculdade Superior Dom Hélder Câmara, Mestre em Direito Processual Civil e membro do IBDFAM.

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